A Mostra

“É um evento sem hierarquias, artista e público nivelados, sem insígnias. Apenas a coragem de ser: Cantautores.”
Cátia de França

“Não havia uma Mostra como essa. Há uma mágica que acontece no encontro do autor com sua criação, nesse modo mais cru, e isso é algo riquíssimo para o público e para os artistas. É um formato que imprime marcas na nossa alma.”
Chico César

“Onde houver um ser humano, um sentimento, um pensamento, a cantautoria vai existir sempre.”
Joyce Moreno

“Perceber a canção na sua essencialidade é algo provocador e fundamental.”
Vitor Ramil

“O violão e a voz são o corpo e a alma dos cantautores. Um festival como esse, que focaliza a composição, é muito importante pra manter a vivacidade da música feita hoje.”
Nelson Angelo

“O cantautor tem uma missão muito importante: é ele quem revela a alma de um povo.”
Ceumar

O cantautor é aquele que entoa suas próprias obras. Na história das civilizações, sempre houve um espaço privilegiado para estes personagens. Artistas solitários da palavra cantada, que carregam em sua música uma infinidade de narrativas, atualizando as mitologias urbanas e os valores de uma sociedade. Feito “antenas da raça”, artesãos da sensibilidade, captam no ar as vibrações do afeto humano e as materializam em melodias e versos. O cantautor é o mago que modela o som na palavra, a palavra no tempo, a alquimia dos ritmos e das alturas. Transporta afetos indispensáveis à nossa atmosfera simbólica, sendo um espécie de rústico guardião de uma tecnologia musical avançadíssima e ancestral: o duo que tem consigo mesmo, cantando e tocando ao som de um único instrumento. A voz do cantautor nunca está só: ela é o espelho de toda uma comunidade.

A Mostra Cantautores Belo Horizonte é um encontro intimista de criadores da canção contemporânea e tem por conceito-base a realização de apresentações solo, em que cantores-compositores tocam suas canções em formato bruto, acompanhados apenas de si próprios.

A 8ª edição do projeto se realiza através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de BH com patrocínio da UniBH e com o apoio cultural do Centro Cultural Sesiminas e Galpão Cine Horto.

Nesse ano, apresentamos 8 artistas de diversas gerações e diferentes partes do país, que com suas múltiplas expressões sintetizam caminhos que nos parecem indispensáveis ao que há de mais interessante nas transformações da linguagem da música popular brasileira hoje. No âmbito do pensamento crítico, a Mostra também realiza uma programação diurna de debates e conversas mediadas.

Nos dias 2, 3 e 4 de dezembro, a Mostra Cantautores transforma BH na capital nacional da canção. Venha conosco!

Curadoria

Os quatro últimos anos foram um período extremamente difícil para a produção cultural no Brasil, não só economicamente, pela rarefação dos mecanismos estatais de apoio à arte e às expressões culturais, mas também do ponto de vista simbólico, espiritual, energético, sutil. Um país guiado por seres insensíveis forma cidadãos insensíveis, e fortalece assim uma cadeia de mediocridade e obscurantismo.

Como regenerar o espaço de trocas afetivas qualificadas e edificantes através da arte, num momento em que se desenha no horizonte a possibilidade de reconstruções fundamentais para a saúde desse ecossistema de sensibilidades? Como reunir, novamente, com alegria e potência, a comunidade, fraturada por inúmeros processos sócio-políticos nestes últimos anos? Como recolocar a escuta no centro do debate, pautá-la como ética diante do panorama contemporâneo da produção em canção popular, mas também do efervescente cenário de transformações políticas em nosso país?

É a essas perguntas que a programação da Mostra Cantautores de 2022 pretende responder, num ano em que o festival se propõe ao desafio de retomar e manter o processo de intercâmbio cultural e político a que sempre se prestou, desde a origem, com um orçamento reduzido a menos da metade da última edição. Mesmo diante da hiper-inflação e (ainda) da falta de incentivos sólidos ao trabalho da cultura, a Mostra Cantautores volta à baila numa edição reduzida e nem por isso menos potente, apostando na qualidade doméstica das relações artísticas, seus eixos de proximidade e afeto, como um traço de diferenciação conceitual em relação ao “grande circuito”. A vontade é promover o potencial quântico do que é pequenino, a qualificação da experiência da escuta compartilhada e consciente. A certeza de que um grupo de pessoas em silêncio ao redor de alguém cantando canções sempre será uma espécie de célula potencial das revoluções necessárias ao nosso tempo.

Nesse sentido, é importante reafirmar nosso gesto de pesquisa como eixo estruturador da construção da programação do festival. Numa época onde o que restou do circuito de eventos dedicados à música quase sempre se pauta por números, retroalimentando uma cultura de mero rankeamento quantitativo que pouco ou nada acrescenta à experiência de formação do ouvinte, nos interessa justamente o oposto. A esse preguiçoso neoliberalismo estético predominante, é preciso contrapor o espírito de investigação inquieta, a subjetividade inconformista, a ação propositiva diante dos modelos culturais hegemônicos para, mais uma vez, “lançar mundos no mundo”, como nos lembra Caetano.

Daí a importância da escolha de artistas-inventores, criadores cuja singularidade se manifesta nos múltiplos níveis textuais da obra, em letras, melodias, harmonias, ritmos, temáticas e abordagens interpretativas. Autores que, com os pés fincados no que há de mais rico na tradição da nossa música popular, apontam para novos caminhos, atualizando o jogo. É importante sublinhar que são também artistas que trafegam com consistência em universos paralelos aos grandes circuitos midiáticos de legitimação, e que trazem nos seus sotaques os traços da pluralidade geográfica, estética e política desse nosso país continental.

Com alegria, nesse ano de 2022, se apresentam na Mostra Cantautores a baiana Josyara, o pernambucano Igor de Carvalho, o alagoano Bruno Berle, a brasiliense Letícia Fialho, o mineiro Davi Fonseca e a norte-mineira/holandesa Jasmin Godoy. E nas sessões de encerramento, teremos a honra de receber os veteranos Maurício Tizumba, figura fundamental no panorama da arte afro-brasileira do nosso tempo, em suas múltiplas expressões, e Badi Assad, cuja força de performance vocal e instrumental ao violão tem sido reconhecida em diversas partes do mundo ao longo das últimas décadas.

Estamos muito felizes em retomar a realização do festival. Sabemos que a Mostra Cantautores, bem mais que um evento, é um grande ponto de encontro da comunidade de criadores e ouvintes interessados na canção popular, tendo se firmado como o principal festival do país nesse segmento pela consistência conceitual do projeto, e pelo amor à essência que o move. Nos orgulhamos de todos os desdobramentos que têm vindo a acontecer no circuito a partir da nossa experiência e desejamos que se multipliquem mais e mais. Um povo que valoriza e ritualiza a própria experiência de escuta é um povo mais unido e preparado para atravessar “o mar agitado da história”, como nos lembrou João Bosco, parafraseando Maiakovski, na sessão de encerramento da nossa edição passada. Assim seja.

Luiz Gabriel Lopes e Jennifer Souza
Curadores Residentes